Estudo avalia consequências do aprendizado de mais de uma língua durante a infância.
Por Barbara Marcolini
Quais os efeitos do aprendizado precoce de uma língua estrangeira? Para responder a essa pergunta, uma psicóloga paulista investigou a fundo estudos que apontam vantagens ou desvantagens do bilinguismo em crianças de até quatro anos. Ela concluiu que os possíveis benefícios do ensino de uma segunda língua dependem em grande parte do ambiente em que a criança vive.
Embora a língua oficial do Brasil seja o português, é crescente o número de crianças que aprendem outro idioma ainda nos primeiros anos de vida. A importância do inglês no mundo globalizado, a manutenção de línguas indígenas em escolas dentro de reservas e a existência de projetos bilíngues em escolas que ficam nas fronteiras com outros países sul-americanos são alguns motivos para o fenômeno.
A psicóloga Elizabete Flory analisou inúmeros trabalhos brasileiros e estrangeiros sobre o desenvolvimento de crianças que aprenderam duas línguas ao mesmo tempo, ou que pelo menos começaram o aprendizado do segundo idioma antes de dominarem o primeiro. O estudo foi feito durante o doutorado da pesquisadora na Universidade de São Paulo (USP).
Flory verificou que, até meados dos anos 1960, o bilinguismo era mal-visto pela maioria dos estudiosos. Testes feitos nos Estados Unidos compararam crianças bilíngues e monolíngues e apontaram uma possível confusão de identidade e quociente de inteligência (QI) mais baixo naquelas que falavam mais de uma língua.
A psicóloga relacionou essas conclusões a algumas falhas nos testes, que não consideravam a situação cultural ou econômica das crianças analisadas. “Esses testes foram feitos com filhos de imigrantes, que viviam em um ambiente onde sua língua e cultura eram desvalorizadas”, analisa.
Foi a partir de um estudo realizado por pesquisadores canadenses no início da década de 1960 que o bilinguismo começou a ser considerado benéfico. A comparação foi feita entre crianças que partilhavam as mesmas condições socioeconômicas e não sofriam discriminação cultural, no caso das bilíngues.
O resultado chegou a surpreender os pesquisadores: as crianças bilíngues se saíram melhor em 15 dos 18 testes de QI aplicados. Mas Flory também questiona o estudo, argumentando que a psicologia atual não considera que o QI determine a inteligência de uma pessoa. “A inteligência é um conceito relativo, que pode se desdobrar em habilidades distintas”, completa.
Vantagens cognitivas
A psicóloga repudia a atribuição de vantagens ou desvantagens absolutas ao bilinguismo precoce. “Dizer que o bilinguismo aumenta a inteligência é tão errado quanto dizer que diminui”, pondera. Ela explica que as crianças bilíngues podem desenvolver algumas capacidades mais cedo que crianças monolíngues, mas isso não significa um aumento da sua inteligência.
Por falarem mais de uma língua, crianças bilíngues desenvolvem mais rápido o que a psicologia chama de “controle inibitório”, pois, enquanto falam uma língua, elas naturalmente inibem a outra. “Isso nos auxilia quando temos muitos estímulos e precisamos nos focar em apenas um deles”, acrescenta Flory.
Além disso, o bilinguismo estimula a flexibilidade do pensamento. Quando uma criança aprende a falar dois idiomas ao mesmo tempo, ela compreende que os objetos podem ter mais de um nome. “Isso freia o que chamamos de respostas automáticas, pois há flexibilidade para se pensar em novas soluções, dar respostas mais criativas”, afirma a psicóloga.
Flory ressalta que o desenvolvimento infantil é muito influenciado pelo contexto em que a segunda língua é aprendida. “Nem sempre todas essas características são observadas no mesmo indivíduo”, diz. “Deve-se levar em conta o ambiente em que essa criança vive e o valor que é atribuído à sua segunda língua.”
A pesquisadora sugere algumas ações que podem auxiliar no acompanhamento de crianças que vivem em ambientes bilíngues. Pais e educadores devem adequar o ensino à capacidade cognitiva da criança – promovendo brincadeiras que envolvam as palavras, por exemplo – e estimular a valorização da segunda língua ao mostrar o porquê do seu uso.
Fonte: Revista Ciência Hoje
Por Barbara Marcolini
Quais os efeitos do aprendizado precoce de uma língua estrangeira? Para responder a essa pergunta, uma psicóloga paulista investigou a fundo estudos que apontam vantagens ou desvantagens do bilinguismo em crianças de até quatro anos. Ela concluiu que os possíveis benefícios do ensino de uma segunda língua dependem em grande parte do ambiente em que a criança vive.
Embora a língua oficial do Brasil seja o português, é crescente o número de crianças que aprendem outro idioma ainda nos primeiros anos de vida. A importância do inglês no mundo globalizado, a manutenção de línguas indígenas em escolas dentro de reservas e a existência de projetos bilíngues em escolas que ficam nas fronteiras com outros países sul-americanos são alguns motivos para o fenômeno.
A psicóloga Elizabete Flory analisou inúmeros trabalhos brasileiros e estrangeiros sobre o desenvolvimento de crianças que aprenderam duas línguas ao mesmo tempo, ou que pelo menos começaram o aprendizado do segundo idioma antes de dominarem o primeiro. O estudo foi feito durante o doutorado da pesquisadora na Universidade de São Paulo (USP).
Flory verificou que, até meados dos anos 1960, o bilinguismo era mal-visto pela maioria dos estudiosos. Testes feitos nos Estados Unidos compararam crianças bilíngues e monolíngues e apontaram uma possível confusão de identidade e quociente de inteligência (QI) mais baixo naquelas que falavam mais de uma língua.
A psicóloga relacionou essas conclusões a algumas falhas nos testes, que não consideravam a situação cultural ou econômica das crianças analisadas. “Esses testes foram feitos com filhos de imigrantes, que viviam em um ambiente onde sua língua e cultura eram desvalorizadas”, analisa.
Foi a partir de um estudo realizado por pesquisadores canadenses no início da década de 1960 que o bilinguismo começou a ser considerado benéfico. A comparação foi feita entre crianças que partilhavam as mesmas condições socioeconômicas e não sofriam discriminação cultural, no caso das bilíngues.
O resultado chegou a surpreender os pesquisadores: as crianças bilíngues se saíram melhor em 15 dos 18 testes de QI aplicados. Mas Flory também questiona o estudo, argumentando que a psicologia atual não considera que o QI determine a inteligência de uma pessoa. “A inteligência é um conceito relativo, que pode se desdobrar em habilidades distintas”, completa.
Vantagens cognitivas
A psicóloga repudia a atribuição de vantagens ou desvantagens absolutas ao bilinguismo precoce. “Dizer que o bilinguismo aumenta a inteligência é tão errado quanto dizer que diminui”, pondera. Ela explica que as crianças bilíngues podem desenvolver algumas capacidades mais cedo que crianças monolíngues, mas isso não significa um aumento da sua inteligência.
Por falarem mais de uma língua, crianças bilíngues desenvolvem mais rápido o que a psicologia chama de “controle inibitório”, pois, enquanto falam uma língua, elas naturalmente inibem a outra. “Isso nos auxilia quando temos muitos estímulos e precisamos nos focar em apenas um deles”, acrescenta Flory.
Além disso, o bilinguismo estimula a flexibilidade do pensamento. Quando uma criança aprende a falar dois idiomas ao mesmo tempo, ela compreende que os objetos podem ter mais de um nome. “Isso freia o que chamamos de respostas automáticas, pois há flexibilidade para se pensar em novas soluções, dar respostas mais criativas”, afirma a psicóloga.
Flory ressalta que o desenvolvimento infantil é muito influenciado pelo contexto em que a segunda língua é aprendida. “Nem sempre todas essas características são observadas no mesmo indivíduo”, diz. “Deve-se levar em conta o ambiente em que essa criança vive e o valor que é atribuído à sua segunda língua.”
A pesquisadora sugere algumas ações que podem auxiliar no acompanhamento de crianças que vivem em ambientes bilíngues. Pais e educadores devem adequar o ensino à capacidade cognitiva da criança – promovendo brincadeiras que envolvam as palavras, por exemplo – e estimular a valorização da segunda língua ao mostrar o porquê do seu uso.
Fonte: Revista Ciência Hoje